02 fevereiro 2013

POESIAS DE STA. TERESA D'ÁVILA 3

Sobre aquelas palavras: “Dilectus meus mihi”

Entreguei-me toda, e assim
Os corações se hão trocado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.
Quando o doce Caçador
Me atingiu com sua seta,
Nos meigos braços do Amor
Minh’alma aninhou-se, quieta.

E a vida em outra, seleta,
Totalmente se há trocado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.

Era aquela seta eleita
Ervada em sucos de amor,
E minha alma ficou feita
Uma com o seu Criador.

Já não quero eu outro amor,
Que a Deus me tenho entregado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.


Colóquio amoroso

Deus meu, se o amor que me tendes
É como o amor que vos tenho,
Dizei: por que me detenho?
Ou Vós, por que vos detendes?

- Alma, que queres de mim?
- Deus meu, não mais do que ver-vos.
- E tu temes? Como assim?
O que mais temo é perder-vos.

Uma alma em Deus escondida,
Que mais tem que desejar?
Senão sempre amar e amar,
E, no amor toda incendida,
Tornar-vos de novo a amar?

Oh! dai-me, Deus meu, carinho!
Oh! dai-me amor abrasado,
E eu farei um doce ninho
Onde for de vosso agrado.


Feliz o que ama a Deus



Ditoso o coração enamorado
Que só em Deus coloca o pensamento;
Por Ele renuncia a todo o criado,
Nele acha glória, paz, contentamento.

Vive até de si mesmo descuidado,
Pois no seu Deus traz todo o seu intento.
E assim transpõe sereno e jubiloso
As ondas deste mas tempestuoso.


Formosura de Deus




Formosura que excedeis
A todas as formosuras.
Sem magoar, dor fazeis
Como sem dor desfazeis
O amor das criaturas.

Oh! laço, que assim juntais
Duas coisas sem igual!
Não sei porque desatais
Pois atando força dais
A ter por bem o que é mal.

Vós juntais quem não tem ser
Com o ser que não acaba.
Sem acabar, acabais,
Sem ter que amar, Vós amais
E engrandeceis nosso nada.


Ais do Destino



Sem Ti como é triste,
Meu Deus, o viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Ai! Como na terra
Longa é nossa estrada!
É duro desterro,
Penosa morada;
Leva-me daqui,
Senhor de meu ser!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Ai! Mundo tão triste
Em que me perdi!
Pois a alma não vive
Se longe de ti.
Meu doce Tesouro,
Que amargo sofrer!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Ó morte benigna
Põe termo a meus males!
Só tu, com teus golpes
Tão doces, nos vales.
Que ventura, ó Amado,
Contigo viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

O amor que é mundano
Se apega a esta vida;
Mas o amor divino
À outra nos convida.
Sem Ti, Deus eterno,
Quem pode viver?
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

A vida terrena
É engano bem triste;
Vida verdadeira
Só no Céu existe.
Deus meu, lá, contigo,
Oh! dá-me viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Quem é que ante a morte,
Deus meu, teme, aflito,
Se alcança por ela
Um gozo infinito?
Oh! sim o de amar-te
Sem mais te perder!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Ai! Minha alma geme
Tristissimamente…
Quem de seu Amado
Pode estar ausente?
Acabe depressa
Tão duro sofrer!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

O peixe colhido
No anzol fraudulento
Encontra na morte
O fim do tormento.
Ai! Gemo e definho,
Bem meu, sem te ver,
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Em vão te procuro,
Pois nunca te vejo;
Jamais alivias,
Senhor, meu desejo.
Ah! isto me inflama
E obriga a gemer:
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Ai! Quando a meu peito
Vens na Eucaristia,
Deus meu, logo temo
Perder-te algum dia;
Tal pena me aflige
E impele a dizer:
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Põe termo a estas penas,
Senhor, e retira
Do exílio esta serva
Que por Ti suspira.
Quebrados meus ferros,
Feliz irei ser.
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!

Mas justo é que eu sofra
Por tantas ofensas,
E expie meus erros
E culpas imensas.
Ai! Logre meu pranto
Fazer-te entender
Que em ânsias te ver-te,
Desejo morrer!